"Eu
Fiz o que era mais
urgente: uma prece. Rezo para achar o meu verdadeiro caminho. Mas
descobri que não me entrego totalmente à prece, parece-me que sei que o
verdadeiro caminho é com dor. Há uma lei secreta e para mim
incompreensível: só através do sofrimento se encontra a felicidade.
Tenho medo de mim pois sou sempre apta a poder sofrer. Se eu não me amar
estarei perdida — porque ninguém me ama a ponto de ser eu, de me ser.
Tenho que me querer para dar alguma coisa a mim. Tenho que valer alguma
coisa? Oh protegei-me de mim mesma, que me persigo. Valho qualquer coisa
em relação aos outros — mas em relação a mim, sou nada. É tão bom ter a
quem pedir. Nem me incomodo muito se eu não for totalmente atendida. Eu
peço a Deus para eu ser mais bonita — e não é que meu olho faísca ao
mesmo tempo que meus lábios parecem mais doces e cheios? Eu peço a Deus
tudo o que eu quero e preciso. É o que me cabe. Ser ou não ser atendida —
isso não me cabe a mim, isto já é matéria-mágica que se me dá ou se
retrai. Obstinada, eu rezo. Eu não tenho o poder. Tenho a prece."
(Clarice Lispector, in 'Um Sopro de Vida' via Citador)
terça-feira, 30 de julho de 2013
segunda-feira, 29 de julho de 2013
domingo, 28 de julho de 2013
Eu sei, acredito e eu quero, não tenho certeza que esteja no caminho certo. Nada está correto nessa afirmação, porque há nela uma única palavra que tem o poder de não nos deixar caminhar corretamente para alcançarmos o nosso sonho. Fácil, arranquemos a erva daninha "não" de tudo que nos desequilibra e obscureça a nossa vontade de conseguir, o caminho sempre aparecerá, e é o certo ------ > Eu sei, acredito e eu quero, tenho certeza que estou no caminho certo. (elpis _/\_ )
sábado, 27 de julho de 2013
"Tenho trabalhado tanto, mas sempre penso em você. Mais de
tardezinha que de manhã, mais naqueles dias que parecem poeira assenta e
com mais força quando a noite avança. Não são pensamentos escuros,
embora noturnos… Sabe, eu me perguntava até que ponto você era aquilo
que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você. Eu queria
saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu
sentia, e se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas
essas coisas que me fascinavam e que no fundo, sempre no fundo, talvez
nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só conseguir ver, e
desamar era não mais conseguir ver, entende? Eu quis tanto ser a tua
paz, quis tanto que você fosse o meu encontro. Quis tanto dar, tanto
receber. Quis precisar, sem exigências. E sem solicitações, aceitar o
que me era dado. Sem ir além, compreende? Não queria pedir mais do que
você tinha, assim como eu não daria mais do que dispunha, por limitação
humana. Mas o que tinha, era seu. Mas se você tivesse ficado, teria sido
diferente? Melhor interromper o processo em meio: quando se conhece o
fim, quando se sabe que doerá muito mais — por que ir em frente? Não há
sentido: melhor escapar deixando uma lembrança qualquer, lenço esquecido
numa gaveta, camisa jogada na cadeira, uma fotografia — qualquer coisa
que depois de muito tempo a gente possa olhar e sorrir, mesmo sem saber
por quê. Melhor do que não sobrar nada, e que esse nada seja áspero como
um tempo perdido. Tinha terminado, então. Porque a gente, alguma coisa
dentro da gente, sempre sabe exatamente quando termina. Mas de tudo
isso, me ficaram coisas tão boas. Uma lembrança boa de você, uma vontade
de cuidar melhor de mim, de ser melhor para mim e para os outros. De
não morrer, de não sufocar, de continuar sentindo encantamento por
alguma outra pessoa que o futuro trará, porque sempre traz, e então não
repetir nenhum comportamento. Ser novo. Mesmo que a gente se perca, não
importa. Que tenha se transformado em passado antes de virar futuro. Mas
que seja bom o que vier, para você, para mim. Te escrevo, enfim, me
ocorre agora, porque nem você nem eu somos descartáveis. … E eu acho que
é por isso que te escrevo, para cuidar de ti, para cuidar de mim – para
não querer, violentamente não querer de maneira alguma ficar na sua
memória, seu coração, sua cabeça, como uma sombra escura." (Caio Fernando Abreu)
sexta-feira, 26 de julho de 2013
quinta-feira, 25 de julho de 2013
"Meu maior medo é viver sozinho e não ter fé para receber um mundo
diferente e não ter paz para se despedir. Meu maior medo é almoçar
sozinho, jantar sozinho e me esforçar em me manter ocupado para não
provocar compaixão dos garçons. Meu maior medo é ajudar as pessoas
porque não sei me ajudar. Meu maior medo é desperdiçar espaço em uma
cama de casal, sem acordar durante a chuva mais revolta, sem adormecer
diante da chuva mais branda. Meu maior medo é a necessidade de ligar a
tevê enquanto tomo banho. Meu maior medo é conversar com o rádio em
engarrafamento. Meu maior medo é enfrentar um final de semana sozinho
depois de ouvir os programas de meus colegas de trabalho.Meu maior medo
é a segunda-feira e me calar para não parecer estranho e anti social.
Meu maior medo é escavar a noite para encontrar um par e voltar mais
solteiro do que antes. Meu maior medo é não conseguir acabar uma cerveja
sozinho. Meu maior medo é a indecisão ao escolher um presente para mim.
Meu maior medo é a expectativa de dar certo na família, que não me
deixa ao menos dar errado. Meu maior medo é escutar uma música, entender
a letra e faltar uma companhia para concordar comigo. Meu maior medo é
que a metade do rosto que apanho com a mão seja convencida a partir com a
metade do rosto que não alcanço. Meu maior medo é escrever para não
pensar." ( Fabrício Carpinejar - trecho de Pais e filhos maridos e esposas II)
terça-feira, 23 de julho de 2013
Procuro-te
Procuro a ternura súbita,
os olhos ou o sol por nascer
do tamanho do mundo,
o sangue que nenhuma espada viu,
o ar onde a respiração é doce,
um pássaro no bosque
com a forma de um grito de alegria.
Oh, a carícia da terra,
a juventude suspensa,
a fugidia voz da água entre o azul
do prado e de um corpo estendido.
Procuro-te: fruto ou nuvem ou música.
Chamo por ti, e o teu nome ilumina
as coisas mais simples:
o pão e a água,
a cama e a mesa,
os pequenos e dóceis animais,
onde também quero que chegue
o meu canto e a manhã de maio.
Um pássaro e um navio são a mesma coisa
quando te procuro de rosto cravado na luz.
Eu sei que há diferenças,
mas não quando se ama,
não quando apertamos contra o peito
uma flor ávida de orvalho.
Ter só dedos e dentes é muito triste:
dedos para amortalhar crianças,
dentes para roer a solidão,
enquanto o verão pinta de azul o céu
e o mar é devassado pelas estrelas.
Porém eu procuro-te.
Antes que a morte se aproxime, procuro-te.
Nas ruas, nos barcos, na cama,
com amor, com ódio, ao sol, à chuva,
de noite, de dia, triste, alegre — procuro-te.
(Eugenio de Andrade)
os olhos ou o sol por nascer
do tamanho do mundo,
o sangue que nenhuma espada viu,
o ar onde a respiração é doce,
um pássaro no bosque
com a forma de um grito de alegria.
Oh, a carícia da terra,
a juventude suspensa,
a fugidia voz da água entre o azul
do prado e de um corpo estendido.
Procuro-te: fruto ou nuvem ou música.
Chamo por ti, e o teu nome ilumina
as coisas mais simples:
o pão e a água,
a cama e a mesa,
os pequenos e dóceis animais,
onde também quero que chegue
o meu canto e a manhã de maio.
Um pássaro e um navio são a mesma coisa
quando te procuro de rosto cravado na luz.
Eu sei que há diferenças,
mas não quando se ama,
não quando apertamos contra o peito
uma flor ávida de orvalho.
Ter só dedos e dentes é muito triste:
dedos para amortalhar crianças,
dentes para roer a solidão,
enquanto o verão pinta de azul o céu
e o mar é devassado pelas estrelas.
Porém eu procuro-te.
Antes que a morte se aproxime, procuro-te.
Nas ruas, nos barcos, na cama,
com amor, com ódio, ao sol, à chuva,
de noite, de dia, triste, alegre — procuro-te.
(Eugenio de Andrade)
segunda-feira, 22 de julho de 2013
Por paradoxal que nos possa parecer, estamos fortes quando nos sentimos fracos. Nesse tempo de fraqueza diríamos que verdadeiramente somos nós próprios o nosso amigo mais íntimo, disso devemos tirar proveito. Sós, temos a coragem e a determinação necessária para ultrapassarmos as fronteiras e distinguirmos exatamente o que é ilusão e fantasia. Esse é o momento de nos amarmos e colher a bênção maior que nos foi dada. É aí que se abrem as portas da fortaleza adjetivada por nós por fraqueza.(elpis_/\_)
domingo, 21 de julho de 2013
Me ame ou odeie
Eu amei,
mal ou bem, eu amei.
Pode não ter sido conforme queria,
o que fazer ? Foi meu jeito de amar.
Amei incondicionalmente,
amei sem trocas, reprovações,
com a extrema forma de entrega
e transparência,
agora é a minha vez de pedir
me odeie por piedade eu quero,
mal ou bem, eu amei.
Pode não ter sido conforme queria,
o que fazer ? Foi meu jeito de amar.
Amei incondicionalmente,
amei sem trocas, reprovações,
com a extrema forma de entrega
e transparência,
agora é a minha vez de pedir
me odeie por piedade eu quero,
me odeie sem medidas nem clemências
quero ódio mais que indiferenças,
porque rancor fere menos que o esquecimento.
Se me odiar ficarei convencida
que me amou com insistência,
mas pense bem e tranquilamente,
só se odeia alguém muito querido.
Quem vale mais, eu pequena e frágil,
ou você grande e forte ?
sexta-feira, 19 de julho de 2013
“Se a dor tiver que vir, que venha rápido”, eu disse. “Porque tenho uma
vida pela frente, e preciso usá-la da melhor maneira possível. Se ele
tem que fazer alguma escolha, que faça logo. Então eu o espero. Ou o
esqueço.
“Esperar dói. Esquecer dói. Mas não saber que decisão tomar é o pior dos sofrimentos.”( Na margem do rio Piedra eu sentei e chorei - Paulo Coelho)
“Esperar dói. Esquecer dói. Mas não saber que decisão tomar é o pior dos sofrimentos.”( Na margem do rio Piedra eu sentei e chorei - Paulo Coelho)
quarta-feira, 17 de julho de 2013
"Não
é correto dizer que o ser humano nasce num dia e morre num outro. Isso é
verdadeiro em relação aos outros animais, mas não em relação ao ser
humano. Animais nascem um dia — eles têm um nascimento — e então um dia
morrem. O ser humano está constantemente morrendo e constantemente
nascendo.
Cada momento é uma morte e um nascimento. Nele, a
morte e o nascimento não são opostos, mas são como duas asas de um
pássaro, complementares, uma ajudando a outra."
(Osho, em "A Sabedoria das Areias: Discursos Sobre o Sufismo")
segunda-feira, 15 de julho de 2013
O Transitório e o Duradouro
"Lastimo os que
atribuem grande importância ao tema do transitório das coisas e que se
perdem em minudências terrenas sem valor. Porque nós existimos
precisamente para transformar o transitório em duradouro, e tal só
acontece quando somos capazes de apreciar ambas as coisas.
A vida, por mais vulgar que pareça ser, por mais que dê a ideia de se satisfazer com coisas triviais e quotidianas, nunca deixa de se ocupar atentamente, ainda que em silêncio, de certas exigências superiores e de procurar os meios necessários à respectiva satisfação."
(Johann Wolfgang von Goethe, in 'Máximas e Reflexões')
A vida, por mais vulgar que pareça ser, por mais que dê a ideia de se satisfazer com coisas triviais e quotidianas, nunca deixa de se ocupar atentamente, ainda que em silêncio, de certas exigências superiores e de procurar os meios necessários à respectiva satisfação."
(Johann Wolfgang von Goethe, in 'Máximas e Reflexões')
domingo, 14 de julho de 2013
sábado, 13 de julho de 2013
sexta-feira, 12 de julho de 2013
"Jovens
e velhos, homens e mulheres, quase todas as pessoas que ela conhecia
queriam as mesmas coisas: queriam sentir paz em seus corações, queriam
uma vida sem sobressaltos, queriam ser felizes. A diferença era que a
maioria dos jovens pensava que essas coisas estavam em algum lugar do
futuro, enquanto quase todas as pessoas mais velhas acreditavam que
essas coisas haviam ficado no passado."(Noites de Tormenta)
quinta-feira, 11 de julho de 2013
Névoa
Cada vez que ele ia embora
eu o retinha nos meus olhos
até a sua volta
Da ultima vez
passou a resistir
então
eu o retive na minha memória
o abraçava bem apertado
ali resolveu habitar
Virou lembrança forte
Virou lembrança fraca
aos poucos fugiu dali
virou névoa
Já não tinha mais força
não tinha confiança
se ainda morasse ali
Só hoje percebi
que quando tento lembrar
meus olhos teimam
chorar por um espaço vazio
que persiste na minha memória.(elpis)
eu o retinha nos meus olhos
até a sua volta
Da ultima vez
passou a resistir
então
eu o retive na minha memória
o abraçava bem apertado
ali resolveu habitar
Virou lembrança forte
Virou lembrança fraca
aos poucos fugiu dali
virou névoa
Já não tinha mais força
não tinha confiança
se ainda morasse ali
Só hoje percebi
que quando tento lembrar
meus olhos teimam
chorar por um espaço vazio
que persiste na minha memória.(elpis)
quarta-feira, 10 de julho de 2013
Quero-te Apenas Porque a Ti Eu Quero
Não te quero senão porque te quero
e de querer-te a não querer-te chego
e de esperar-te quando não te espero
passa meu coração do frio ao fogo.
Quero-te apenas porque a ti eu quero,
a ti odeio sem fim e, odiando-te, te suplico,
e a medida do meu amor viajante
é não ver-te e amar-te como um cego.
Consumirá talvez a luz de Janeiro,
o seu raio cruel, meu coração inteiro,
roubando-me a chave do sossego.
Nesta história apenas eu morro
e morrerei de amor porque te quero,
porque te quero, amor, a sangue e fogo.
(Pablo Neruda)
e de querer-te a não querer-te chego
e de esperar-te quando não te espero
passa meu coração do frio ao fogo.
Quero-te apenas porque a ti eu quero,
a ti odeio sem fim e, odiando-te, te suplico,
e a medida do meu amor viajante
é não ver-te e amar-te como um cego.
Consumirá talvez a luz de Janeiro,
o seu raio cruel, meu coração inteiro,
roubando-me a chave do sossego.
Nesta história apenas eu morro
e morrerei de amor porque te quero,
porque te quero, amor, a sangue e fogo.
(Pablo Neruda)
terça-feira, 9 de julho de 2013
segunda-feira, 8 de julho de 2013
"Rapte-me, leve-me para algum lugar fora de
mim. Pode ser a lua, o tártaro, cidades invisíveis, qualquer espaço
depois do mapa. É preciso ter tanto e sempre para sonhar além dessas
águas plúmbeas, para não se afogar diariamente no breu que meus
olhos cavam na luz. Pois se repito infinitamente que tenho amor, pois
se me comovo com crianças que tremem, pois se não tenho fome de nada e
me flagelo pelas fomes alheias, o que falta para dar a exata medida de
minha existência?" (Os girassóis de ontem -Tiago Fabris Rendelli)
domingo, 7 de julho de 2013
Um homem chamado Alfredo
"O meu vizinho do lado
Se matou de solidão
Ligou o gás, o coitado
Último gás do bujão
Porque ninguém o queria
Ninguém lhe dava atenção
Porque ninguém mais lhe abria
As portas do coração
Levou com ele seu louro
E um gato de estimação
Há tanta gente sozinha
Que a gente mal adivinha
Gente sem vez para amar
Gente sem mão para dar
Gente que basta um olhar
Quase nada
Gente com os olhos no chão
Sempre pedindo perdão
Gente que a gente não vê
Porque é quase nada
Eu sempre o cumprimentava
Porque parecia bom
Um homem por trás dos óculos
Como diria Drummond
Num velho papel de embrulho
Deixou um bilhete seu
Dizendo que se matava
De cansado de viver
Embaixo assinado Alfredo
Mas ninguém sabe de quê"(Vinicius de Moraes)
Excelente poema, do não menos excelente Vinicius de Moraes, com mensagem de amor ao próximo que serve de alerta para que lancemos um olhar de carinho àqueles que carregam o pesado fardo da solidão. (elpis)
Se matou de solidão
Ligou o gás, o coitado
Último gás do bujão
Porque ninguém o queria
Ninguém lhe dava atenção
Porque ninguém mais lhe abria
As portas do coração
Levou com ele seu louro
E um gato de estimação
Há tanta gente sozinha
Que a gente mal adivinha
Gente sem vez para amar
Gente sem mão para dar
Gente que basta um olhar
Quase nada
Gente com os olhos no chão
Sempre pedindo perdão
Gente que a gente não vê
Porque é quase nada
Eu sempre o cumprimentava
Porque parecia bom
Um homem por trás dos óculos
Como diria Drummond
Num velho papel de embrulho
Deixou um bilhete seu
Dizendo que se matava
De cansado de viver
Embaixo assinado Alfredo
Mas ninguém sabe de quê"(Vinicius de Moraes)
Excelente poema, do não menos excelente Vinicius de Moraes, com mensagem de amor ao próximo que serve de alerta para que lancemos um olhar de carinho àqueles que carregam o pesado fardo da solidão. (elpis)
sábado, 6 de julho de 2013
Libertação
Sempre que nos sentimos leves e profundamente em paz significa que estamos completamente entregues. Com uma nova posição mental e longe dos velhos hábitos, não oferecemos resistência para novos sonhos e para que outra realidade aconteça.(elpis _/\_ )
quinta-feira, 4 de julho de 2013
Sou a Tua Casa
Sou a tua casa, a
tua rua, a tua segurança, o teu destino. Sou a maçã que comes e a roupa
que vestes. Sou o degrau por onde sobes, o copo por onde bebes, o teu
riso e o teu choro, o teu frio e a tua lareira. O pedinte que ajudas, o
asilo que te quer acolher. Sou o teu pensamento, a tua recordação, a tua
vontade. E também o artesão que para ti trabalha, o medo que te
perturba e o cão que te guia quando entras pela noite. Sou o sítio onde
descansas, a árvore que te dá sombra, o vento que contigo se comove. Sou
o teu corpo, o teu espírito, o teu brilho, a tua dúvida. Sou a tua mãe,
o teu amante, o marfim dos teus dentes. E sou, na luz do outono, o teu
olhar. Sou a tua parteira e a tua lápide. Os teus vinte anos. O coração
sepultado em ti. Sou as tuas asas, a tua liberdade, e tudo o que se move
no teu interior. Sou a tua ressaca, o teu transtorno, o relógio que
mede o tempo que te resta. Sou a tua memória, a memória da tua memória, o
teu orgulho, a fecundação das tuas entranhas, a absolvição dos teus
pecados. O teu amuleto e a tua humildade. Sou a tua covardia, a tua
coragem, a força com que amas. Sou os teus óculos e a tua leitura. A tua
música preferida, a tua cor preferida, o teu poema preferido. Sou o que
significas para mim, a ternura que desagua nos teus dedos, o tamanho
das tuas pupilas antes e depois de fazer amor. Sou o que sou em ti e o
que não podes ser em mim. Sou uma só coisa. E duas coisas diferentes.
(Joaquim Pessoa, in 'Ano Comum'-retirado de Citador)
(Joaquim Pessoa, in 'Ano Comum'-retirado de Citador)
quarta-feira, 3 de julho de 2013
O que me mata é o quotidiano
Dor? Alegria? Só é
simplesmente questão de opinião. Eu adivinho coisas que não têm nome e
que talvez nunca terão. É. Eu sinto o que me será sempre inacessível. É.
Mas eu sei tudo. Tudo o que sei sem propriamente saber não tem sinônimo
no mundo da fala mas enriquece e me justifica. Embora a palavra eu a
perdi porque tentei falá-la. E saber tudo sem saber é um perpétuo
esquecimento que vem e vai como as ondas do mar que avançam e recuam na
areia da praia. Civilizar minha vida é expulsar-me de mim. Civilizar
minha existência a mais profunda seria tentar expulsar a minha natureza e
a super natureza. Tudo isso no entanto não fala de meu possível
significado.
O que me mata é o quotidiano. Eu queria só exceções. Estou perdida: eu não tenho hábitos.
(Clarice Lispector, in 'Um Sopro de Vida')
O que me mata é o quotidiano. Eu queria só exceções. Estou perdida: eu não tenho hábitos.
(Clarice Lispector, in 'Um Sopro de Vida')
terça-feira, 2 de julho de 2013
segunda-feira, 1 de julho de 2013
Amor com Incompreensão
" Porque eu fazia do
amor um cálculo matemático errado: pensava que, somando as
compreensões, eu amava. Não sabia que, somando as incompreensões, é que
se ama verdadeiramente. Porque eu, só por ter tido carinho, pensei que
amar é fácil. É porque eu não quis o amor solene, sem compreender que a
solenidade ritualiza a incompreensão e a transforma em oferenda. E é
também porque sempre fui de brigar muito, meu modo é brigando. É porque
sempre tento chegar pelo meu modo. É porque ainda não sei ceder. É
porque no fundo eu quero amar o que eu amaria – e não o que é. É porque
ainda sou eu mesma, e então o castigo é amar um mundo que não é ele. É
também porque me ofendo à toa. É porque talvez eu precise que me digam
com brutalidade, pois sou muito teimosa."
(Clarice Lispector, in 'Felicidade Clandestina')
(Clarice Lispector, in 'Felicidade Clandestina')
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